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Hoje é o dia mais feliz da minha vida


A palavra cirurgia é nobre: apela a "fazedor de milagres" ou "aquele que salva vidas". Agora Plástico? Plástico dá a sensação de "coisa falsa", de fake. De algo "postiço" ou a fingir. E se juntarmos as duas? Se juntarmos as duas temos a especialidade médica mais bonita que existe: a única que junta saúde mental, arte criativa, engenharia anatómica e atrevo-me a dizer elegância e costura - a Cirurgia Plástica.


Digo que sempre soube que queria ser Cirurgiã Plástica. Quando analiso na minha mente como isto começou, dou por mim a lembrar-me de ficar atónica com a primeira vez em que vi a minha mãe costurar à máquina. Vivia em Coimbra, a minha mãe trabalhava como professora primária para Surdos na Escola de Tábua. Tinha como hobbie a costura, tal como a minha avó. O meu pai era médico, surdo, recém-formado, com um coração de engenheiro para ossos - tinha o sonho de ser ortopedista mas não conseguiu nota para a especialidade. Ficou-se pela clínica geral, pela construção de aviões em miniatura e a pesca. Mais tarde envergou pelas próteses dentárias, ortodentia, distração óssea e outras áreas da chamada "ortopedia dento-facial"- que nada mais é do que cirurgia que muda a forma - é plástica. Manteve uma paixão pela anatomia e pela medicina legal. Mas os dois, quando namoraram, teciam juntos tapetes de Arraiolos.


A minha mãe ensinou-me a costurar pequena. Comecei aos 5 anos a perceber os conceitos de transformar um desenho e um projecto bidimensional em realidade tridimensional. Aos 7, fiz a minha primeira roupa: umas luvas para completar um disfarce de Carnaval (estava numa escola de freiras no Funchal e fui vestida de "menina de cabaré").


Quando visitava o meu pai em Coimbra, ia com ele à quinta da minha avó onde ele criava animais. Cada animal sacrificado para nos alimentar era uma oportunidade para aprender anatomia. Aprendi a distinguir uma cápsula dum cortex renal. A serosa e a mucosa dum intestino. Uma artéria duma veia. A grande e pequena circulação. Aprendi a entender as fáscias ou "gorduras" e até mesmo a suturar - comecei pelo peru de Natal com cordel. Também ia com ele às clinicas - Coimbra, Cabaços e Alveiazere. Percebi que cumprimentar as pessoas e ser o médico "da aldeia" era do mais inspirador e respeitoso que havia. Que todos lhe eram gratos e sabiam quem era o Dr. João Santareno.

Para mim médico era abraçar as pessoas, tal como o meu pai. Não colocar limites nas horas nem nas urgências. Chegar a Coimbra à 1h da manhã, jantar e descansar para recomeçar no dia seguinte. Os momentos em que vi o meu pai ser mais feliz foi a cuidar e a abraçar os doentes. E eu queria ser assim.


Na adolescência vieram as artes. Eu era uma miúda tímida que me tinha mudado com a mãe e a irmã para uma ilha (Madeira), onde não pertencíamos. A integração foi dura e eu sentia-me profundamente insegura a falar em público. A minha mãe percebeu - e bem - que as artes performativas seriam o melhor caminho. Comecei aos 8 anos no teatro; passei pelo piano e pela ginástica rítmica, pela rádio, pelo curso de modelo mas mantive-me sempre fiel ao teatro, até aos 18 anos. Aprendi a expressar-me e a não vergonha de falar em público. Fui praxada, à séria, pelos encenadores. Percebi que só a exigência e a frustração me guiariam à excelência. Por tràs, a minha mãe manteve sempre a conduta da educação ética. E o incutir dos valores que ainda hoje chamo de "invendáveis".


A história é longa e a minha entrada em Medicina foi dura à séria. Mas consegui. Fui viver sozinha para o Porto. Passei o primeiro Natal em 2004, aos 18 anos, sozinha. O meu foco: ser médica e cirurgiã. Desde o primeiro ano da faculdade que colei na porta do meu quarto uma placa (que ainda hoje tenho) onde se lê "bloco operatório".

Pelo meio apaixonei-me pelas neurociências - área na qual escrevi o meu mestrado. E apaixonei-me pela força e vontade de vencermos todos os obstáculos quando temos um sonho. Mesmo que uma doença me tenha desafiado no percurso, aos 21 anos, mas me tenha mostrado que a fé e o alcance de acreditar não têm limites. Que devemos ser gratos. Que as pessoas morrem sozinhas nas enfermarias. Saí da cadeira de rodas, ganhei 15 kgs à custa dos imunossupressores, e reconstruir-me de novo.

Quando alcancei o final do curso, a minha entrada na especialidade foi o reviver da história do meu pai: não tive nota, não consegui, mas sabia que tinha dado o meu melhor (é um exame injusto que não mede competências). Aceitei seguir Medicina Geral e Familiar, inspirada no meu pai. Mas desde o segundo dia do ano de 2011 que sabia não pertencer ali.


Um ano e meio mais tarde, fruto de muito foco (e uma sorte que "dá muito trabalho" a que chamo "destino divino") entrei na minha especialidade de sonho: a Cirurgia Plástica Reconstrutiva e Estética. Foi no dia em que o Papa Francisco iniciou funções: dia 13 de Março de 2013, o dia de anos da minha irmã. Um dos dias mais felizes (se não o) da minha vida. Deixei tudo para trás e mudei-me para aquela que seria a minha terceira cidade: Lisboa. Comecei no Hospital de Santa Maria no dia 1 de Abril (parecia mentira) e segui sempre com uma enorme felicidade e sentido de ajudar o outro naquela que é a especialidade que carinhosamente chamo de "psiquiatria cirurgica".


A cirurgia plástica é a arte cirúrgica através da qual a análise psicologica e física permitem fazer arte. É um projecto artístico em que aquilo que parece bidimensional se torna trimensal. Atrevo-me a dizer que alcança outra dimensão - a modificação do soma tem efeito na psique. Verifica-se um fenómeno reconstrutivo externo e interno.Um biofeedback. E o limiar para o alcançar de forma positiva, ou negativa, é ténue.


Cirurgia significa explorar, pensar, dissecar, consertar.

Plastikus significa mudar a forma, reutilizar, reciclar, adaptar, não desistir.


Cirurgia Plástica significa arte. Significa Amor. Significa sofrer de claustrofobia do mundo e ser verdadeiramente livre, com asas e ar no meu /nosso palco dos sonhos - a The Dr Pure Clinic.



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